sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Silêncio Póstumo

Bem, Sylvan é uma banda alemã de rock progressivo, pelo menos é o que este álbum contempla. Deixo as minúcias de caracterização para o ouvinte. Uma apresentação se faz mister, porém de forma lacônica só pra situar algum leitor destemido que por ventura se interesse em ler o texto inteiro. A banda é composta por Marco Glühmann (vocais), Matthias Harder (bateria), Sebastian Harnack (baixo), Jan Petersen (guitarra) e Volker Söhl (teclados). Este disco ainda conta com participações de Stefanie Richter (cello), Guido Bungenstock (guitarra), Ensemble Vokalkolorit (choir). Vale um comentário que Marco tem doutorado em física, aparentemente pela University of Tübingen e, claro, interpreta muito bem. Quando escuto o cd eu lembro de Final Cut do Pink Floyd, em que Waters consegue passar, quase sozinho, todo o drama. Guardem as suas devidas proporções, obviamente. Well, well... Vamos a temática.

Construir uma obra musical conceitual, como é o caso deste disco, é uma tarefa bastante árdua e que deve resistir a uma cobrança enorme do público. Os fãs mais nostálgicos desse tipo de empreitada artística dirão que obras do rock progressivo clássico ocupam o Olimpio e não podem ser alcançadas por nenhuma banda com uma obra mais atual. A dúvida é: será que o Sylvan conseguiu entrar pra galeria seleta de grandes obras conceituais?

Bom, o disco começa bem com uma introdução modesta e faz bem seu papel de pintar o cenário da história. O clima sombrio está criado nos primeiros suspiros de Marco, onde podemos visualizar alguém aparentemente deprimido e sozinho num quarto, onde vaga na sua plena solidão, aparentemente sentindo falta de alguém. Porém, erra quem se adianta em dizer que foi um caso amoroso que não deu certo. Na segunda estrofe percebemos a indagação “why you left, my child?”. Tal indagação, se bem interpretada, esclarece as figuras da história. Agora sabemos que o rapaz que vaga só é um pai que, aparentemente, perdeu uma filha.

A história vai girar basicamente em cima da jornada do pai tentando superar o trágico “suicídio” de sua filha. Por essa jornada conseguimos ver os vários estágios que passou a pequena garota que abandonou este mundo. A história e as melodias conseguem elucidar o mundo angustiante da garotinha que se foi.

Bom, para isso devemos dar seqüência à análise, partindo para a segunda música, “In Chains”, que é a leitura do diário da pequena garota angustiada com esse mundo. Essa música traz temas às vezes estranhos aos ouvidos, mas contém belas melodias. As partes mais “atravessadas” melodicamente remontam a angústia que vivia a garotinha, que se sentia presa num mundo onde ela não podia confiar em ninguém, e suas confissões demonstram a sua dificuldade de reproduzir verbalmente suas dúvidas e sentimentos. A tentativa de normatizar seus sentimentos a tormentava. As confissões de sua aflição vão sendo feitas ao seu diário onde há também a aspiração de se encontrar um lugar melhor a se viver. E é exatamente nessa parte da música que podemos encontrar um ótimo solo de teclado e guitarra por volta dos 4 a 5 minutos, bem simples, porém bem eloqüentes em expressar a bela letra da música.

A música seguinte, Bitter Symphony serve como o gancho para a Pane of Truth. Nessa parte o pai se deita após ler o diário de sua filha e sente a culpa lhe consumir. Indaga-se de como não percebeu os anseios de sua própria filha. A música Pane of Truth é uma que merece destaque certo nesse disco. É uma obra de 9 minutos, que trabalha vários climas diferentes na viagem de consciência do pai da garotinha. Enquanto é reproduzida na mente do pai, a história dele com a filha, a música trata de montar o cenário ideal, que conta com um refrão lindíssimo. A remontagem da história dos dois conta até com trechos de reprodução de brigas dentro de casa, por volta dos 3 minutos, onde podemos ouvir a filha apanhando e também se trancando no quarto enquanto seu pai bate na porta após uma briga. O clima é montado com maestria, a produção musical é invejável.

A música seguinte, No Earthly Reason, é outra ponte que se liga à música seguinte, Forgotton Virtue. Aqui é contado como era o dia a dia da garotinha. Forgotton Virtue também é uma música que conta com melodias meio atravessadas, mas consegue colocar a história no lugar certo. O clima sombrio e pouco amigável remonta o desgosto da garotinha lidando com o mundo. A situação que o mundo cria na garotinha é de desolação, ela perde a fé na humanidade, não consegue entender como as pessoas se conformam com um mundo sem virtudes e valores.

A música seguinte é, em minha opinião, a obra mais bela do disco. Uma canção linda, com uma inigualável melodia, The Colors Changed. Essa música marca o desejo da garotinha de construir um novo mundo, cheio de cores. O desejo é tão profundo e tão sincero que ela começa a construir esse mundo com a sua alma. O rito de passagem começa aos 3 minutos da música e constrói uma atmosfera majestosa que atinge um pico magnífico aos 4 minutos e culmina no belo refrão. Na seqüência um solo, simples e direto, que encerra com maestria a música.

A Sad Sympathy é outra ponte que se liga à excelente peça de progressivo, Questions. A ponte nos coloca em meio às noites mal dormidas do pai, que visualiza um desenho feito pela filha para ilustrar as manhãs de seus dias. O pai entende os desenhos da forma descrita na música Questions, que é uma dura crítica à sociedade. A música coloca o mundo como um lugar egoísta, onde as pessoas ouvem apenas o que querem, fazem apenas o que lhes convém e correm pelos becos escuros como se isso fosse normal. A menina se mostra angustiada de se tornar parte dessa massa inexpressiva e se questiona de como a sociedade pode moldá-la e tornar parte daquilo que ela abomina. A parte instrumental dessa música é uma das mais bem trabalhadas do disco. Conta com um excelente trabalho de teclado e riffs muito bem pensados, além de um refrão muito bem colocado.

A música seguinte, Answer to Life, se mostra imponente já pelo seu começo que dá o tom de uma marcha militar bem orquestrada. Essa música conta com uma melodia simples, mas que marcam bem o ouvinte. O refrão conta com uma segunda voz mais alta que foi colocada na medida exata, criando um clima eficaz sobre uma melodia simples. Em relação à trama da história a música relata a forma que a garotinha lidava com sua vida. Essa música parece ser uma mensagem específica ao pai, quando ao final da canção ela fala sobre ter se decepcionado e que isso deveria ter sido melhor pensado por ele, mas que agora é tarde, pois ela não mais existe.

Message from the Past reproduzi alguns dos temas usados em outras músicas do mesmo disco. É uma canção serena, com um leve piano e uma cama por trás de muito bom gosto. Apesar de ter 3 minutos de duração ela serve mais como uma transição na trama. A esse ponto na história temos o último encontro da alma do pai com a filha. The Last Embrace trás melodias um tanto quanto incomuns, nesse ponto são as preces da garotinha que embarca sua alma pra outro lugar. É o ponto de encruzilhada de sua alma. Em minha opinião uma música sem grandes atrativos, mas que serve pra compor a trama.

A seguir a dupla final de canções, A Kind of Eden e Posthumous Silence. A penúltima música se encarrega de acalmar o clima pesado da música anterior. Finalmente a garota encontra paz em outro mundo e pede para que seu pai a deixe ir. Uma belíssima música conta com bastante simplicidade, mas com competência em seus arranjos. O refrão é uma ótima reprodução da trama, onde as últimas mensagens direcionadas ao pai são ecoadas com bastante emoção. Ao final desta canção conseguimos ouvir trechos de notícias que relatam o momento em que a polícia acha o corpo da garota em meio a lixeiras em um estacionamento, mas sem sinais de trauma. A polícia não faz idéia do que houve com a garota.

Essa parte traz um toque de mistério à história. Sem causas aparentes a morte da garota ecoa como algo sobrenatural. As interpretações a partir desse ponto são escravas da criatividade de cada um. Em um consenso entre amigos chegamos à conclusão de que a alma da garota apenas desvaneceu. Sua tristeza e decepção com o mundo eram tão grandes que sua vida apenas cessou. Enquanto isso sua alma achou um lugar melhor para ocupar em outro plano de existência.

A seguir o grand finale. A música título do disco fecha a jornada com perfeição. Uma obra grandiosa com um arranjo espetacular monta uma cena parecida com a primeira do disco: o pai, enclausurado em seu quarto, sente o abandono da filha. Mas finalmente ele a liberta para seguir livre, vagando em seu mundo colorido, sem egoísmo, sem falsidade e sem cobranças. O vocal faz um excelente trabalho dramático nessa canção. A culpa consome o pai da garota enquanto a guitarra faz um brilhante solo, porém bem simples.

Dessa forma é fechado um excelente e magnífico trabalho de uma banda com muito potencial. É uma obra, que se escutada com atenção, dá voz aos mais profundos desesperos e anseios da alma, ressalta nuances de sentimentos guardados ao fundo do ser. São seqüências de notas majestosamente montadas. Um disco intenso e com bastante consistência.

Respondo à pergunta inicial de forma positiva. Acredito sim que o Sylvan tenha se colocado ao lado de grandes obras do rock progressivo clássico com esse disco, se não foi no Olimpio foi no Éden. Os links abaixo estão com letras e em 320kbps. Divirtam-se.



Site da banda


Link para Download: part1 e part2


Link alternativo: Sylvan







quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Hipocrisia economicamente correta.


Amanhã às 09h08min da manhã, horário de Brasília, será a festa de abertura dos jogos olímpicos da China. A festança será um evento memorável, cheio de fogos, luzes, apresentações culturais, etc. Todo o aparato de distração costumeiro a esses eventos. Porém, com a chegada dessa festividade não pude parar de perceber um “detalhe” interessante sobre a dinâmica mundial de relação entre Estados. Falo especificamente da relação China – Estados Unidos.


O presidente Bush esteve em Pequim ontem para inaugurar uma embaixada norte-americana. E a constante em seu discurso foi a de sempre: enfatizar sua preocupação com a falta de liberdade de expressão do povo chinês e a ausência de trabalhos humanitários no país. George W. Bush enfatizando sua preocupação com Direitos Humanos na China... Fato curioso, porém não vai ser o foco da discussão. Pois o que mais me intriga é que mesmo a realidade da China sendo fato de conhecimento de todos que habitam o globo terrestre os EUA não tomam nenhum tipo de reação ou retaliação a fim de alterar tal realidade. O discurso de Bush foi apenas um discurso, carente de parte prática efetiva de ação. A China é um país declaradamente comunista, e sabem qual era um grande país comunista? A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Lembram qual era a relação entre EUA e URSS? Algo que “apelidaram” de Guerra Fria.


Obviamente existe algo de estranho aí no meio. O discurso norte-americano associava o regime comunista à vinda de Satã pra Terra. As criancinhas nascidas nesse período em território norte-americano não ouviam histórias de bicho papão, nem do bandido do saco, apenas do grande vilão do mundo, o comunismo. Era um terror. Mas se o comunismo era o vilão, e agora ele não é mais, o que houve?

Acho que teria algo a ver com o regime econômico da China... Talvez seja pq a China seja um dos maiores parceiros comerciais dos EUA. Talvez seja pq o maior importador de produtos chineses seja os EUA, e que a China seja a principal credora dos títulos da dívida pública dos EUA. Acho que a economia planificada da URSS não era boa o suficiente pros EUA relevarem seu regime comunista como apenas um desvio padrão do comportamento de uma nação, da mesma forma como fazem com a China.

Entraram no Iraque por “medo de armas de destruição em massa” mas nunca cogitaram de sequer ameaçar a China. A hipocrisia reina absoluta, e todo mundo sabe da verdade. Todo mundo sabe e todo mundo finge não saber. Fica aquela panaca caipira do Texas fazendo o que bem entende do mundo e dos EUA até o ponto em que tudo vira uma bola de neve fora de controle. Aliás, a grande ilusão do homem é achar que pode controlar qualquer coisa.


Enfim, a situação que se constrói é a mesma de sempre, o teatro da hipocrisia geral. E ainda devemos agüentar aqueles que levantam bandeiras liberalistas de crenças utópicas de que as nações cooperam pelo bem da convivência, de que o estado democrático de direito se sustenta na sua crença em valores humanos, blá, blá, blá... O estado democrático de direito faliu, e quem ta bancando ele é o capitalismo. A coordenação da dinâmica entre nações é feita pelo papai, o capitalismo, enquanto o filho irresponsável, o estado democrático, sai arrumando briga na rua e volta pra casa sempre com uma mão na frente e outra atrás.

“big money goes arround the world” E tenho dito.


Danda.