domingo, 10 de fevereiro de 2008

A constituição do ser

O ser humano é um ser diferenciado de todas as outras criaturas existentes nesse planeta. O ser humano é um ser pensante, racional. A sua racionalidade significa ter capacidade de estabelecer padrões de comportamento e ação para que assim seja possível tomar uma atitude com fins pré-estabelecidos. Dentro da racionalidade do ser está sua capacidade de dar valores às ações, aos objetos e à tudo aquilo que o circunda.

Desde o seu nascimento o ser está absorvendo trechos de realidade e estabelecendo relações e padrões, mesmo que subconscientemente. Se as relações sociais que constituem uma realidade estão submetidas à coerção e doutrinas o ser apresentado a esse meio estará, desde cedo, estabelecendo padrões baseados nessas relações condicionadas. Logo, a natureza do ser, propriamente dita, será omitida dando lugar a condicionamentos pré-estabelecidos por ordens de poder.

A hierarquização social se dá por meio de relações de poder. Aquele, ou aqueles, que têm o controle dos meios materiais são os condicionadores da dinâmica social. Dentro de uma sociedade são vários os meios materiais que entregam esse tipo de realização para seus possuidores. Mídia, mercado, religião, política, etc. O mercado, sem dúvidas, é a maior força condicionadora dos tempos atuais. A classe empresarial é quem determina o mercado. Essa classe, em busca de lucros, propõe meios capazes de determinar o comportamento de uma multidão, e é essa a tarefa da classe empresarial. Mobilizar classes a fim de girar o mercado. A propaganda e o marketing são formas reais de se doutrinar as pessoas a certos valores e comportamentos. Caso claro é como que numa sociedade o valor atribuído ao que é novo e ao que está exposto pela mídia como bom é maior do que o valor atribuído ao que, de forma concisa, se determina melhor. Explico:

Quem nunca ouviu a frase genérica: “ah, não fazem mais tal coisa como antigamente!”? Essa frase é bem curiosa, pq ela exprime uma realidade decadente. As coisas se tornam descartáveis e supérfluas. A frenética ação do mercado atrás de lucro determina uma rotina de consumo psicótico. Existe uma urgência em comprar tudo àquilo que é propagandeado. Essa produção super-desenvolvida deixa a qualidade de lado e dá lugar à quantificação da matéria. O propósito e a razão de existência dos produtos se perdem em meio à ganância e à alienação das pessoas. O foco da produção se tornou apenas o ganho financeiro, quando deveria ser a qualidade e a utilização dos produtos, que por conseqüência geraria lucro. Um objeto deve ser desenvolvido com fim no seu próprio uso, e não no que ele pode gerar em termos de rendimentos financeiros.

Essa distorção é refletida diretamente na sociedade. Se quem produz quer determinar movimentos sociais eles têm tal capacidade. A indução ao consumo se dá de formas até mesmo não compreensíveis. O ser absorve tudo que o circunda, o que significa que a mensagem não precisa ser necessariamente explícita. Cada filme da Disney que vc, inocentemente assiste, é cheio de mensagens que expõe valores daqueles que o escreveram. Vc absorve tais valores mesmo sem perceber e isso vai determinando uma ordem social que reflete valores daqueles que possuem os meios materiais.

Quando vc cresce e se determina como ser capaz de refletir suas ações e de repelir certos tipos de valores e aprendizados, baseado no que vc já experienciou, há, incrustado em vc todos esses valores subconscientes.

Ao final temos a pergunta: somos livres? Somos livre pensadores? Somos capazes de repelir e repensar nossa propria existencia?



Danda


7 comentários:

Anônimo disse...

Achei o texto muito bem elaborado e muito coerente. E concordo em parte das idéias. Não darei voltas porque creio na clareza do texto e entendimento de quem o lê.
Respondendo às perguntas: sim.
As indagações se concentram, principalmente, no final do texto, quando aparecem as palavras “subconsciente”, "mensagem não precisa ser necessariamente explícita", "absorve tais valores mesmo sem perceber". O que acontece é exatamente o contrário. Percebemos a mensagem, mas a nossa capacidade de avaliação difere enormemente por diversos fatores. Sejam eles sociais, culturais, fisiológicos e por aí vai. Essa parte é entendida como se fossem mensagens subliminares. Pois subliminar é não perceber a mensagem conscientemente e, se não a percebemos, é exatamente o que diz a parte "valores mesmo sem perceber". Só que se esses valores são detectados pelos observadores, eles deixam de ser subliminares. Pois logicamente há uma contradição. Na outra parte em "O ser absorve tudo que o circunda, o que significa que a mensagem não precisa ser necessariamente explícita" é um pouco diferente. Aqui, trata-se de implícito, ou seja, subentendido. O que é completamente diferente de subliminar, não perceber conscientemente. O subconsciente que planeja ações e executa decisões próprias sem o consentimento da pessoa não existe. O ponto em que quero chegar é que as mensagens, os valores anunciados em propagandas e pela mídia, não são anunciados com o propósito de o consumidor não perceber, pois as ações são feitas pelo consciente que precisa de um estímulo. O manejo da informação, da relação com o fim de um produto, é deixado a cargo do objeto alvo. Se uma empresa diz que algo é bom por isso, cabe a nós questionar se isso é bom ou não - com suas devidas proporções e deixando de lado exemplos como um anúncio de um produto agrícola não ser útil para um estudante de física; pelo menos a priori. Ao final, somos inteiramente capazes de repensar a nossa existência usando fatos atrelados a uma lógica conceitual. Quero dizer, usando a inteligência e níveis de instrução particulares, nossa capacidade intelectual, podemos "repelir certos tipos de valores e aprendizados" constantemente.

Esquadrão SS disse...

Bom, foi levantada uma questão conceitual de consciente e sub consciente. Como eu n sou habilitado a dispor sobre tais conceitos de maneira concisa me conterei a dar meu parecer na base de opiniões e não de estudo. O que digo no texto ser absorvido pelo ser como subconscientemente são coisas tais como padrões de beleza, imagens com valor atribuído, etc. Por exemplo, existem pessoas que se sentem em paz num ambiente natural, cercado por natureza, já outras pessoas n aguentam esse tipo de ambiente e preferem o caos e correria duma cidade, e isso é reflexo duma exposição à tais padrões de realidade de forma n consciente, mas que refletem em uma forma de agir consciente. Porém, essa forma consciente de agir n necessariamente evidencia suas raízes, apenas refletem uma orientação inerente do seu ser. Por isso acho difícil expelir completamente os valores incrustados no ser a afim de obter uma visão nítida do que se chama realidade. Essa visão será sempre condicionada pela sua vivência e pelos valores e padrões que foram atribuídos à realidade que o formou.

Unknown disse...

Interessante o texto.Serei breve e responderei à pergunta final: Não,no que diz respeito ao cotidiano. Acredito que todas as avaliações que fazemos das coisas materiais que nos cercam carregam uma influência gerada por algo de importante ou de rotineiro que acontece à nossa volta.Por exemplo,Danda,será que você gostaria de Rush se o seu pai não escutasse quando você era criança? Apesar do título do blog ser "A revolução da razão pura",acredito que existem coisas, principalmente gostos e opiniões informais, que refletem o contexto social em que vivemos,ou seja, não são fruto de uma análise criteriosa ou de uma escolha solitária.
Agora em relação à situações que envolvem mais raciocínio e criatividade,creio que sofremos menos influência e nos baseamos mais no que realmente analisamos antes de tomar algum partido.
Parabéns pelo texto.

Esquadrão SS disse...

Muito bem colocado, Well. Concordo plenamente.

Anônimo disse...

Vou ter de ir no sentido oposto, pelo menos em parte. O que eu disse está intimamente relacionado com o ambiente em que vivenciamos e vivemos atualmente, bem como o nível de capacidade de escolha. Veja bem, os valores, sejam os mais simples como viver em um ambiente calmo ou agitado são percebidos e experimentados, isto é, são conscientes. Talvez morar em um ambiente agitado tenha uma associação com costume, mas nada com inerente ao ser. Se você não está exposto a tais padrões conscientemente, não há escolha, porque o subconsciente não faz por si mesmo. O tiroteio em escolas americanas, por exemplo, não foi executado por subconscientes revoltados. Por isso, uma questão de escolha é confrontada com padrões, experiências, cultura etc. Se não fôssemos capazes de repensar nossa existência não seríamos capazes também de quebrar certos Regimes, pois estaríamos presos numa realidade dolorosa mas factível. Se fosse dizimada a população de um país e todas as pessoas nascidas a partir de então estivessem submetidas a um regime de escravidão. Seria possível repensar a existência a fim de se tornar livre ou os indivíduos estariam atrelados a sua vivência e os padrões dados por tal circunstância? É drástico, porém podemos adaptar. O nível de estudo, apreensão dos padrões, faz alguns vislumbrar e lutar por outra condição incomum. Quando é mostrado algum estilo musical, para ilustrar apenas, o mais corriqueiro é a não abrangência. Se forem postos o jazz e o axé para uma pessoa escolher sua preferência, nitidamente as primeiras palavras serão de ambiente social. Peguemos um bahiano que entende de música. Ele terá outro quesito pra avaliar sua preferência. Se pegarmos um bahiano entendedor de música e que possui a cesso a internet, seu leque de opções será maior. Se pegarmos um que, além de tudo citado, possa viajar pelo mundo conhecendo outros gêneros musicais? O que quero dizer com isso é que, independente do ambiente em que se encontra, escolhas são feitas de maneira consciente, mesmo que só tendo experimentado dois gêneros musicais. Algumas coisas são prescindíveis de análises apuradas porque elas já foram feitas com o passar do tempo. Não é um problema de raciocínio tão apurado.

Esquadrão SS disse...

Eu entendo o que vc coloca, Xuãozim. Claro que temos a maior parcela de responsabilidade sobre nossas escolhas e sobre a revisão de nossos conceitos e vivências. Mas o que quero dizer é que sempre, SEMPRE, seremos escravos de padrões absorvidos por nós inconscientemente. Padrões esses que estruturarão raciocínios conscientes. E as vezes nossa própria percepção de consciência acaba nos desvirtuando da verdadeira estrutura emocional por trás de nossos valores.

Como é o caso de sentimentos atrelados à uma pessoa. O amor é "natural"? Ele é inerente ao ser humano, ou isso é criado socialmente, sendo uma construção subsciente da nossa mente?! Atribuímos valores sem perceber o tempo inteiro, como é o caso do conservadorismo moral. A própria hierarquização social é fruto dessa atribuição de valores não conscientes.

Danda

JF disse...

Lucidez Soberba..Tudo de bom o texto..
Fiquei feliz pela sua visita na SérieEchoes.
Saudações
JF